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A natureza em suas mãos – Aproximando Surdos e a educação ambiental

Julia Barral, Felipe Giraud e Vivian M. Rumjanek

Resumo: O Brasil possui áreas de preservação ambiental que totalizam 18% de nosso território. Essas áreas visam proteger ecossistemas, a vida silvestre e sítios naturais. No entanto, para preservar é necessário conhecer. Pela dificuldade de comunicação produzida pela barreira linguística, a comunidade Surda tem um acesso mais limitado à informação. Acrescente-se a isso que locais onde os Surdos poderiam se beneficiar de uma educação não formal não estão preparados para recebê-los.

Como resultado, a comunidade Surda, grande parte por desconhecimento, não é muito participativa nas questões ambientais e desconhece muito do nosso patrimônio natural. Lembrando que a preocupação ambiental vai além do aspecto científico e envolve aspectos emocionais, levando à formação de uma consciência sobre a importância da natureza e da biodiversidade, o que permite uma tomada de decisões consciente nesta área. Para tal, na Reserva Biológica União, procuramos criar um modelo de formação de guias de interpretação ambiental Surdos, e este capítulo descreve a experiência.

Introdução

Um passeio? Um aprendizado? Uma descoberta? Segundo o Ministério do Meio Ambiente:

Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (BRASIL, 1999, sem página).

A educação ambiental e da natureza pode ser abordada sob o ponto de vista formal, nas escolas, e também não formal, sob diversos formatos, em museus, mostras, reservas naturais etc., estando amparada pela Lei nº 9.795, de 27 de abril de 1999 (BRASIL, 1999). Estes espaços permitem uma ampla difusão desse conhecimento.

A preocupação ambiental excede o saber científico pela ciência e envolve a relevância de imbuir uma consciência e um conhecimento sobre a importância da natureza, da biodiversidade, e de como conter a degradação ambiental. Esse conhecimento permite a tomada de decisões consciente em uma área que atinge a todos.

Como, então, deveria ser apresentada essa educação ambiental? Existem evidências de que a exposição de modo informal à ciência durante a infância e adolescência desenvolve e mantém uma fascinação maior por ciência nesse grupo (BONNETTE; CROWLEY; SCHUNN, 2019). A importância da emoção no aprendizado é inegável e não deve ser minimizada, graças à grande relação que existe entre os processos cognitivos e emocionais (IMMORDINO-YANG; DAMASIO, 2007; TYNG et al., 2017). Neste contexto, a educação ambiental fora da escola, em uma mostra, em uma ida a um museu, jardim zoológico ou botânico, pode vir a ter um impacto muito mais duradouro do que aquele obtido na sala de aula. Particularmente, visitas a reservas ambientais são capazes de despertar a curiosidade unida ao prazer.

Mas será que o mesmo se aplica a pessoas com deficiência? Terão acesso a reservas ambientais? Quais as barreiras? Conseguimos imaginar que pessoas com mobilidade reduzida têm dificuldade em visitar uma reserva ambiental. Afinal, como resolver o problema de trilhas em uma reserva, sem causar um grande impacto no ambiente? Ou cegos, que precisam aproveitar todos os outros sentidos – audição, olfato, tato – para perceberem o que os cerca. Mas e os Surdos? Eles não precisam de alguma adaptação?

     Quando pensamos em adaptações para pessoas com deficiência, os Surdos desaparecem do nosso cenário imaginário. Não foi diferente na Reserva Biológica União, ao se criar – em 2013 – acessibilidade a pessoas em cadeiras de rodas e pessoas com deficiência visual (TAVARES, 2013). Naquele ano, foi inaugurada a Trilha Interpretativa do Pilão, e os Surdos não haviam sido contemplados. A Reserva Biológica União (REBIO União) foi criada em 1998 e está situada em uma região de mata atlântica que engloba os municípios de Casimiro de Abreu, Rio das Ostras e Macaé no estado do Rio de Janeiro. É conhecida como sendo o habitat do mico-leão-dourado.

Mas por que se preocupar particularmente com os Surdos? Existe uma frase, quase chavão, que diz que os Surdos são invisíveis. São desconhecidos para a sociedade, e isso não é diferente no ambiente museal. Ao analisar a acessibilidade para pessoas com deficiência em 109 museus e centros de ciência da América Latina, Norberto Rocha et al. (2020) descreveram que a maior parte das iniciativas envolvia acessibilidade física, poucas possuíam acessibilidade atitudinal ou comunicativa. Por exemplo, só 2,7% possuíam mediação em língua de sinais, 11% disseram que esta existia parcialmente e 85% disseram que não possuíam nada. Com relação a exibições com vídeos, 85% não ofereciam tradução com vídeos sinalizados (NORBERTO ROCHA et al., 2020).

Em um estudo anterior, em que foi realizado um levantamento sobre mediadores de museus de ciência no Brasil, cerca de 60% declararam não estar preparados para receber pessoas com algum tipo de deficiência. E, dentre os que responderam favoravelmente, só uma minoria afirmou poder mediar uma visita com Surdos (CARLÉTTI; MASSARANI, 2015). Como exemplos de exceção, o Museu de Arte Moderna de São Paulo (LEYTON; LUCENA; MUSSI, 2008) e, mais recentemente, o Museu do Amanhã no Rio de Janeiro (FERNANDES, 2019) contrataram para seus quadros mediadores Surdos, fato este que atraiu e aumentou a frequência do público Surdo para estes locais.

A situação não é diferente quando se trata de reservas ambientais. A comunidade Surda, grande parte por desconhecimento, não é muito participativa nas questões ambientais. Da mesma forma que havia sido observado em museus, nos demos conta da pequena quantidade ou inexistência de guias ambientais educativos Surdos. Este trabalho mostra a iniciativa de formar guias Surdos, utilizando-se diversas abordagens que visam tornar a comunidade Surda mais conhecedora dos ecossistemas que nos cercam e participativa nas discussões que envolvam problemas ambientais.

Cultura Surda e ciência

No Brasil, de uma população de 196,8 milhões (em 2010), havia 9,7 milhões de pessoas com dificuldades auditivas (5,1% da população geral). Destas, 20,6% (cerca de 2 milhões) eram surdas. A população do Brasil, em 2018, foi estimada em 208,5 milhões, mas não há estimativa sobre o número de surdos ou deficientes auditivos neste momento.

Quando falamos em Surdos, com a palavra sendo iniciada com letra maiúscula, nos referimos a surdos que se comunicam através da Língua Brasileira de Sinais (Libras) e pertencem ao que se denomina Identidade Surda Política. Uma maior compreensão da identidade ou cultura Surdas e seus desafios atuais pode ser encontrada no texto de Perlin e Strobel (2014).

Este grupo encontra-se inserido em seu país de origem, cuja população é formada majoritariamente por uma sociedade “ouvinte” que utiliza a língua oral. Há diferentes graus de surdez, e cada indivíduo tem suas especificidades. No Brasil, o ouvinte (indivíduo sem déficit de audição) utiliza a língua portuguesa como sua língua oral e escrita, mas, para aqueles que não ouvem, a língua utilizada para se comunicar vai depender do grau e da idade em que ocorreu a perda auditiva.

Os surdos oralizados normalmente são aqueles que ensurdeceram depois de ter sido possível aprender a língua oral de forma espontânea e usam a língua portuguesa oral e escrita na comunicação. Os surdos não oralizados utilizam a Libras, que é sua modalidade visoespacial, e muitos apresentam enormes dificuldades com relação à língua portuguesa escrita (GESSER, 2009).  Mundialmente, é reconhecido que estudantes surdos ou com deficiência auditiva possuem uma grande dificuldade em entender ou aprender a forma oral ou escrita da língua oral nacional de seu país (MARSCHARK; LUNG; ALBERTINI, 2002). 

Pela dificuldade de comunicação produzida pela barreira linguística, a comunidade Surda tem um acesso mais limitado à informação que normalmente é transmitida pela mídia de forma oral ou escrita (ALMEIDA; SCHIAFFINO; RUMJANEK, 2014; SCHIAFFINO; RUMJANEK, 2012). Seja esta informação transmitida na escola ou pela sociedade. Acrescente-se a isso que pouca atenção é dada ao ensino de ciências para alunos Surdos, incluindo educação ambiental. Com isso, a Língua Brasileira de Sinais (Libras) possui poucos sinais técnicos científicos e são mais raros os sinais disponíveis necessários para a comunicação de conceitos ecológicos (RUMJANEK, 2016).

Essa foi nossa experiência ao visitar a Reserva Biológica União pela primeira vez e na companhia de um Surdo. A pergunta formulada por ele “Por que estão tirando árvores para colocar árvores?” revelou dois aspectos: a dificuldade de expressão em uma língua em que todas as árvores possuem um único sinal e a crítica ao aspecto ilógico de arrancar árvores para plantar outras. No caso, substituir eucaliptos por árvores nativas.

Mesmo um conhecimento superficial sobre ciência é fundamental na sociedade contemporânea. O baixo interesse dos Surdos pela área científica, não só no Brasil, mas também mundialmente, pode ser o resultado da pouca ênfase que é dada ao ensino de ciências para Surdos (MOORES; JATHO; CREECH, 2001). É preciso considerar, também, que uma boa compreensão da ciência envolve também o questionamento e a argumentação. E isso envolve não só a geração de perguntas relacionadas a conceitos abstratos como uma terminologia que está além da compreensão do público Surdo (JONES, 2014).

Torna-se necessário tentar vencer este entrave, pois é fundamental que o conhecimento seja adquirido em paralelo ao espírito crítico, principalmente em situações que, no futuro, tornem necessárias as tomadas de decisão.

Abordagens e etapas

Partimos do pressuposto de que, para preservar, é necessário conhecer. Com este projeto, visávamos identificar se seria possível e o que seria necessário para o treinamento de guias ambientais educativos Surdos. O objetivo final seria a conscientização dos Surdos sobre a importância da preservação do meio ambiente. Mas, para que haja envolvimento, é preciso despertar a curiosidade e oferecer meios para que a vontade de compreender seja atendida. O visitante Surdo precisaria então conhecer, questionar e buscar a explicação.

A Reserva Biológica União foi visitada uma primeira vez para discutir a importância e dificuldades encontradas pelo público Surdo e qual seria a viabilidade do projeto. Presentes nessa reunião estavam os autores deste capítulo, que são ouvintes, e um pedagogo Surdo. Neste momento discutimos vários aspectos e qual seria a metodologia.

A abordagem metodológica envolveu diversas etapas. A escolha dos primeiros Surdos para testar a possibilidade de formar guias ambientais recaiu sobre jovens Surdos sinalizantes que haviam terminado o ensino médio e participavam de atividades no Projeto Surdos-UFRJ[1].

Devido à carência em certas áreas do conhecimento, a primeira etapa buscou introduzir o conceito de sustentabilidade para esses jovens Surdos. Para tal, eles visitaram a exposição Sustentabilidade, no Museu Ciência e Vida, da Fundação Centro de Ciências e Educação Superior à Distância do Estado do Rio de Janeiro (Fundação Cecierj), localizado no município de Duque de Caxias (RJ). Na ocasião, foram treinados para atuarem como mediadores Surdos para alunos surdos que visitassem a exposição. Dessa forma, suas dúvidas tinham que ser apresentadas e respondidas. Desenvolveram um espírito crítico com relação ao problema e mediaram essa exposição em duas ocasiões.

Em uma segunda etapa, esse grupo de Surdos acompanhados do tradutor-intérprete de Libras (TIL), fizeram uma visita à Reserva Biológica União, passando por todas as fases da visita: a apresentação envolvendo aspectos históricos, a importância da reserva, o tipo de flora e fauna, seguiram a Trilha do Pilão, pernoitaram na Reserva e, no dia seguinte, discutiram suas dúvidas e sugestões.

Em uma terceira etapa, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), participaram de uma oficina em que mimetizavam uma área devastada, ou com plantas e árvores, observando os efeitos produzidos pelas secas e pelas chuvas. A ocasião serviu para o levantamento de mais questões e para se verificar a ausência de sinais.

Em uma quarta etapa, iniciou-se a adaptação do livreto de apresentação da reserva, que era distribuído para o público, para ser transformado em um vídeo em Libras (VÍDEO RESERVA BIOLÓGICA UNIÃO, 2016). Essa etapa durou alguns meses para permitir um vídeo realmente compreensível e para o desenvolvimento de novos sinais. A estratégia utilizada para o desenvolvimento de sinais ligados à reserva foi a de anotar as perguntas feitas durante a visita à trilha, verificar os sinais que eram necessários para traduzir para Libras o material explicativo e discutir com o grupo questões ligadas à preservação da natureza.

            Ao analisar o material a ser adaptado, verificou-se a necessidade de desenvolver 36 sinais de um total 112 sinais específicos da área. Neste momento, também se criou o sinal em Libras para denominar a Reserva Biológica União, que está apresentado na figura a seguir.

Início da descrição: Figura da pedagoga surda Lorena Assis Emidio fazendo o sinal da Reserva Biológica União – uma árvore e pendurado nela, em um galho, um mico. Fim da descrição.
Figura 1: Sinal da Reserva Biológica União, feito por Lorena Assis Emidio. Fonte: Acervo dos autores.

Em paralelo, visando exclusivamente o treinamento futuro de novos guias de interpretação ambiental, e não os visitantes, produziu-se um outro vídeo em que as explicações normalmente oferecidas pela bióloga da Reserva na trilha do Pilão receberam uma versão em Libras. A última etapa envolveu a visita de alunos surdos de uma escola municipal para testar o modelo.

Discussão

O Brasil possui enormes áreas de preservação ambiental, totalizando 18% de nosso território (MMA, 2020a). Essas reservas visam proteger ecossistemas, a vida silvestre e proteger sítios naturais raros, singulares e de grande beleza cênica (MMA, 2020b). Mais uma vez, os Surdos encontram-se um pouco alijados desse processo, que é tão fundamental para envolver a criação de uma consciência crítica que permita a compreensão das consequências locais e globais de determinadas intervenções da sociedade.

A visitação à Trilha do Pilão, na Reserva Biológica União, é normalmente precedida por uma visita a um auditório onde se apresenta a reserva através de uma palestra com projeções. A parte inicial descreve historicamente o que era aquela área, as mudanças sofridas, a importância das reservas de conservação, a fauna da região, a flora etc. No caso de visitantes Surdos, a bióloga fazia uma apresentação com a interpretação simultânea para Libras pelo TIL do nosso grupo.

A apresentação era longa, e o foco necessário para quem faz leitura labial ou acompanha a língua de sinais requer uma capacidade de atenção visual muito intensa e cansativa. Ao mesmo tempo, havia a dificuldade de apreciar as imagens projetadas por ser necessário desviar o olhar do TIL. Tanto os nomes dos animais ou das plantas não possuíam sinais, exigindo do TIL que ele se utilizasse da datilologia. Pouco tempo depois, era possível observar a falta de atenção da plateia.

A primeira medida solicitada pelos Surdos é que a palestra só ocorresse depois da visitação, para contextualizar o que haviam visto, e que a visitação fosse interrompida em inúmeros pontos para permitir perguntas.

Acompanhar uma trilha, estreita na maioria das partes, que permita no máximo duas pessoas lado a lado, também é um diferencial para quem não pode se comunicar através do som. É preciso um tipo de organização para que o guia, ao comunicar-se por sinais, seja visto. As observações e perguntas de quem está na trilha se limitam a quem está do seu lado ou imediatamente atrás ou na frente. Apesar de haver áreas mais amplas, em que é possível parar para que o TIL ou biólogo expliquem e respondam perguntas, muitas vezes o item ou fato de interesse não está mais visível.

A presença de cinco guias ambientais Surdos para um grupo de cerca de 20 visitantes Surdos, permitiria uma distribuição espacial com trocas de informação. Menos importante, mas também sugerida, a existência de uma pequena bandeira que pudesse ser levantada e, assim, ficasse visível para todos quando houvesse necessidade de comunicar algo emergencial.

A visita da escola municipal com alguns alunos Surdos foi precedida por uma demonstração, pelo grupo do Projeto Surdos, de uns modelos com plantas, terra, área devastada, área para escorrer a água etc., com o objetivo de mostrar a importância das florestas no equilíbrio ambiental. Essa demonstração foi realizada na escola, visando despertar o interesse e instigar perguntas dos alunos ao visitar a reserva.

O problema dos Surdos com relação ao conhecimento dos impactos produzidos com a quebra do equilíbrio ambiental continua sendo a falta de vivência. Na época em que este projeto foi testado, havia inclusive poucos sinais em Libras sobre educação ambiental, ecologia e sobre a natureza. Como discutido por Rafisa e Leite (2010) e Rafisa (2012), em uma série de trabalhos envolvendo educação ambiental (EA), “a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) não tem sinais que contemplem temas da EA como reciclagem, meio ambiente, e até mesmo o próprio nome EA” (RAFISA; LEITE, 2010), que não possui um sinal próprio. Prossegue dizendo: “Vale salientar que, para a criação de novos sinais, é necessário que os mesmos sejam de acordo com o cotidiano deles e de fácil acesso para eles” (RAFISA; LEITE, 2010). A partir de então, vários grupos já passaram a gerar diferentes sinais, por exemplo, na área de ecologia (RIBEIRO, 2019).

Qual a importância dos guias de interpretação ambiental Surdos? A mediação para Surdos realizada por surdos não se limita a traduzir o que os mediadores ouvintes estão falando, isso um bom intérprete de Libras pode fazer se possuir um vocabulário de sinais específicos adequado. O que o mediador Surdo acrescenta é a sua cultura e sua visão e seu conhecimento do mundo, que difere daquele do ouvinte (RUMJANEK, 2016). Portanto, precisamos sensivelmente compreender as demandas dos Surdos e sua cultura, a fim de optarmos pelas melhores estratégias neste processo de inserção social.      

Cultura surda é o jeito de o sujeito surdo entender o mundo e de modificá-lo a fim de torná-lo acessível e habitável ajustando-o com as suas percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades Surdas e das “almas” das comunidades Surdas (STROBEL, 2008 apud PERLIN; STROBEL, 2014, p. 24). 

Isso significa que abrange a língua, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do Surdo.

O projeto que gerou esta experiência não teve continuidade. Apesar de todo o apoio recebido da Reserva Biológica União, não obtivemos verbas que permitissem que a formação de guias de interpretação ambiental Surdos locais acontecesse. Mas isso não desmerece a experiência, que mostrou que essa formação deve ser considerada.

É fundamental que a população Surda tenha acesso a esse conhecimento. Em um estudo envolvendo alunos ouvintes de Biologia, foi verificado que      

aulas de campo em ambientes naturais apresentam maior frequência de citação como a melhor lembrança do curso […] quanto mais preservado o ambiente natural, maior a frequência relativa de citação no que se refere à melhor lembrança (SENICIATO; CAVASSAN, 2009, p. 407).

Conclusão

A comunidade Surda, grande parte por desconhecimento, não é muito participativa em questões ambientais. Este projeto buscou quebrar esta barreira, produzida pela língua e a carência de informação, envolvendo jovens Surdos como guias ambientais. Visávamos com isso aumentar o conhecimento e envolvimento da comunidade Surda nas questões que abrangessem nosso patrimônio natural.

Na Reserva Biológica União, procuramos identificar os problemas encontrados por esse público e criar um modelo de formação de guias Surdos para interpretação ambiental, expandindo o léxico da Libras para conter novos termos, produzindo material educativo e treinando um grupo de estudantes Surdos para testar o modelo e servirem de agentes divulgadores.

Agradecimentos

            Agradecemos a Whitson José da Costa Jr. e Aline Oliveira Santos Mouza, da Reserva Biológica União, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Rio das Ostras, estado do Rio de Janeiro, por permitirem o desenvolvimento e prestarem toda colaboração e apoio necessários em todas as etapas deste trabalho; a Nuccia De Cicco, do Projeto Surdos – UFRJ, por participar e ajudar em várias das atividades; a professora Deia Maria Ferreira dos Santos, do Instituto de Biologia da UFRJ, pelas explicações de um modelo ecológico; a Eliane Camacho; à Secretaria Municipal de Educação de Rio das Ostras e à Escola Municipal Maria Teixeira de Paula pelo apoio. Financiamento: Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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TYNG, C. M. et al. The Influences of Emotion on Learning and Memory. Frontiers Psychology, v. 8, article 1454, 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01454. Disponível em: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyg.2017.01454/full. Acesso em: 3 fev. 2021.

PROJETO SURDOS – UFRJ. Reserva Biológica União (vídeo em Libras e legendado). 2018. (17min45s). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=VLvJVpfPcA8A. Acesso em: 13 jan. 2021.


[1] Este projeto, criado em 2005, visa inserir o jovem surdo na sociedade, através do conhecimento científico. Desde então, vem realizando várias ações, incluindo o desenvolvimento de um glossário de biociências em Libras (BARRAL; SILVA; RUMJANEK, 2012; BARRAL; MASCARENHAS; RUMJANEK, 2017; BARRAL; RUMJANEK, 2018; RUMJANEK; DA-SILVA, 2019). É importante salientar que, durante as atividades do Projeto Surdos, eles realizam cursos e estágios laboratoriais, aprendem questionando, realizando experiências, trabalhando em grupo e desenvolvendo um espírito crítico (PINTO-SILVA; MARTINS; RUMJANEK, 2013; PINTO DA SILVA, 2013; BARRAL; PINTO-SILVA; RUMJANEK, 2017). O tradutor-intérprete de Libras (TIL), autor deste artigo, já havia participado por alguns anos das atividades do Projeto Surdos, quando conheceu a metodologia deste.

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